sexta-feira, 18 de outubro de 2013

ORIGAMI



ORIGAMI


“Marta, a batalha está a sua espera! Enfrente os leões, acalme as feras!”.
Lembro-me deste fatídico dia. Quando meu pai, prestes a me deixar, soltou aos ventos de Monte Verde essas palavras, exatamente dessa forma. O local era a pequena via férrea da pequena cidade em que vivíamos, essa cena me atormenta como um flashback todos os dias de minha vida.
“Adeus papai! Qualquer dia volte para me contar sobre São Paulo! Estarei sempre aqui te esperando!” Estas simples palavras foram as únicas que consegui dizer, mas não foram todas que pensei em dizer...
Os anos se passaram e cá estou, grande metrópole brasileira, ou, como costumo dizer: “Cidade preto e cinza”. Atualmente trabalho como cozinheira de um restaurante no centro, mas tenho que me desdobrar em faxineira, médica, mãe, professora, psicóloga e em muitas outras para conseguir viver. Sei que sou só mais uma dentre milhões de pessoas que vivem aqui, então,  posso concluir que meu caso não é especial, tampouco digno de pena.
De segunda a sexta o horário é apertado. Às 4 da manhã já estou pronta para sair de casa, dona Marlene, uma senhorinha muito gentil que mora na mesma vila que eu, cuida dos meus filhos: Luiza e Filipe. Fico aflita em saber que todos os dias vou ao trabalho sem dizer um simples “Eu te amo” aos meus pequenos, mas se faz necessário certos sacrifícios para que a batalha seja vencida.
Sábados e domingos? Não posso nem mesmo almoçar com minha família. O maior privilégio que tenho é poder assistir os desenhos matinais de domingo com meus filhos. Eles ficam bravos comigo, pois tento conversar com eles na hora em que o coiote tenta alcançar o papa-léguas e acontece algo que, para eles é muito divertido.
Crianças! O que seria de mim sem eles. Só de poder chegar em casa e ver aqueles sorrisos meigos cheios de dentes de leite, um raladinho no joelho por conta da bicicleta, só de ouvir um “que delícia!” se tratando da  comida que faço rapidamente para que eles possam dormir cedo. E o melhor é poder cobri-los toda noite e ouvi-los falando sobre suas profissões futuras. Luiza quer ser fotógrafa e Filipe, jornalista, arquiteto, engenheiro, astronauta...
E a cada vez que vejo aqueles olhinhos brilhando lembro-me de meu pai novamente. Já faz 34 anos que ele disse aquelas palavras e até hoje espero para vê-lo. Agora, já não se faz necessário os contos sobre São Paulo e nem os contos de fadas. Enfrento as bruxas da realidade todos os dias e a todo instante. As feras? Essas feras estão dentro de mim! Meus filhos precisam dessas feras para protegê-los desse mundo frio, cheio de falsos sapatos de cristal e casas feitas de bolo. Se é que você me entende...
 Meu pai deve estar por aí, nesse enorme planeta Terra. Talvez se ele me encontrar, passará despercebido. Gostaria que ele pudesse me ouvir dizer “Pai, a batalha me chamou e não recusei!”


Texto de: Alexandra Cristina

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 #Smaaack

Um comentário:

  1. Cara, que escrita perfeita Xanda ! Nossa! Leitura que te prende, nem um pouco cansativa e com um toque poético que só vi nos grandes escritores da literatur portuguesa. Isso é claro sem falar no tema da história, mega original e nada clichê MODEUUUUUUUS , I need more

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